Rua movimentada, carros que passavam em alta velocidade. Uns corriam para a escola, outros voltavam de ônibus. Eram cinco, seis ônibus circulando – os que iam, os que vinham... Carros baixos em absurda velocidade, e eu pensava: “deve ser essa tal de correria do dia-a-dia , né”.
Estou dentro do ônibus, o segundo de hoje, a diferença é que esse me levará para casa, na zona rural - há quilômetros e quilômetros distante daqui. Passo próximo a uma escola pública/municipal em condições tristes. Nunca estudei lá, mas já tive oportunidade de visita-la e reflito - mais uma vez – sobre a educação no Brasil, sobre as crises, as deficiência de professores, de infraestrutura, essas coisas todas. Lembro que estou na melhor escola do Rio Grande do Norte, salas com ar-condicionado, televisão, projetor, mesas e cadeiras limpas, biblioteca, setor de saúde e até psicóloga...
Tirando esses fatos que serviu de reflexão e tudo um mais... eu digo que o que me interessa aqui é dizer que no meio desse trânsito de carros, estudantes, escolas, etc... Eu observo, de longe, duas crianças: Juan e Valentine. Crianças brancas, muito brancas. Quem os visse pela primeira vez, como eu, poderia cogitar anemia aguda. Brancos de cabelos loiros, haviam aspectos distintos em seus rostos; Juan parecia impaciente, Valentine apenas com ar de medo – olhando para os carros velozes. Ele não levava cadernos ou livros nos braços, uma das suas mãos é que segurava firme a outra de Valentine. Ela já carregava dois cadernos em um dos braços. Os dois tinham a mesma pequenina altura. Valentine tinha um sinal embaixo da bochecha, era bonito...
Estavam ali, na calçada da escola, esperando um breve espaço de tempo para que pudessem correr, atravessando a rua até ou outra lado.
Tentaram, de mãos dadas, atravessar uma primeira vez – sem sucesso. Depois de alguns segundos percebem que o movimento estava diminuindo e poderiam tentar outra vez, foi quando Valentine – sempre mais paciente – puxou o braço de Juan. Ele, que dava um passo na hora em que um carro surge veloz em sua frente.
Era chegada a vez do meu ônibus passar daquela fila enorme de carros, o trânsito extenso foi diminuindo, acho que não mais verei Juan e Valentine, pensei, e continuei a leitura de “O muro” de Sartre. Achei que já tinha observado o bastante daqueles dois. Foi quando, sem que eu percebesse, os pequeninos tentaram – de mãos dadas novamente – atravessar a rua. O problema é que eu só percebi depois, quando sinto estrondos e movimentos bruscos. Um freio em meio a alta velocidade em que o ônibus se encontrava, fui levada de corpo inteiro a bater no vidro à frente – o que fica por trás do motorista -, começo a ouvir as vozes rocas, agudas, chorosas, as buzinas dos carros, tudo anunciava a tragédia: meu ônibus acabara de estraçalhar dois pequeninos corpos, que a dois minutos tentavam, supostamente, atravessar a rua na direção de casa.
Todos desceram para ver a tragédia. Eu fiquei. Fiquei no ônibus, sem olhar pros lados. Tive medo de encontrar outras crianças, outras pessoas...
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